Criticando - Flores do Oriente

Jin ling shi san chai
Direção: Zhang Yimou
China, 2011
★ ★ ★ ★

Visualmente impecável. Forte e poderoso. Personagens de fácil identificação. Em alguns momentos, excessivamente típicos . A história, apesar das duas horas e meia de duração, é envolvente. Surpreendente também. "Flores do Oriente" retrata um triste capítulo da história da humanidade. O evento que ficou conhecido como o "Massacre de Nanquim", aconteceu em 1937, quando tropas japonesas, após invadirem a China e outros países asiáticos, estupraram e mataram milhares de mulheres. Muitas delas, principalmente chinesas e coreanas, eram mantidas em bordéis militares sendo submetidas à constante violência sexual. 
Já contextualizados, passemos então para a história do filme. Os primeiros quinze minutos mostram exclusivamente cenas de guerra. O combate entre chineses e japoneses, ficando claro que, por falta de armas adequadas, os chineses estavam em desvantagem. Conheçamos então os personagens: John Miller (Christian Bale), um ocidental enviado por uma agência funerária para realizar o enterro do padre da Catedral de Winchester, morto nos combates. Em meio ao cenário de destruição e sofrimento, ele encontra duas garotas, que pertencem justamente ao convento da catedral de Winchester. Juntos, chegam à igreja, e lá encontram-se com as jovens estudantes do convento. Mais tarde, um grupo de prostitutas também procura refúgio na catedral até que possam deixar a cidade de Nanquim. Passamos agora, a acompanhar o conflito dos grupos que, pouco a pouco vão aprendendo a lidar com as desavenças internas para poderem sobreviver a um perigo muito maior: o ataque das tropas japonesas.
Narrado com emoção e poesia, o longa apresenta os fatos de maneira lenta, porém, não entediante. Ao contrário, a principal capacidade do filme, eu diria, é entreter. O ambiente de constante pressão e insegurança mantém o espectador vivo. E o desejo de conhecer os personagens, também. Inicialmente, John é insensível e desumano. Como o corpo do padre desaparecera nos destroços, o coveiro exige seu pagamento às crianças para poder partir. As crianças rogam ao desconhecido que as ajudem, o que efetivamente acontece no primeiro ataque japonês à igreja. Ao ver soldados perseguindo as meninas para estuprá-las, Jonh se comove pela primeira vez e, finalmente para alívio dos espectadores, toma uma decisão de herói (como diria Yu Mo (Ni Ni), a mais atraente das prostitutas refugiadas na catedral) naquela que foi, ao menos para mim, a cena mais emocionante do longa. John finge ser padre, e pede aos soldados que os deixem em paz. É claro, os japoneses não dão ouvidos ao padre, mas a cena, além de ser um primeiro passo para a mudança do personagem de Bale, é magnificamente montada e ensaiada, e como tantas outras durante o filme, a fotografia é de encher os olhos, tornando o ambiente doloroso e poético, absurdamente palpável. 
Após esse primeiro ataque, os refugiados ficam sob vigilância japonesa. O comandante exige que as garotas formem um coral até sua próxima visita para que, como saberemos mais adiante, cantem em uma festa militar. Mas é claro, logo percebemos as verdadeiras intenções dessas tropas: buscar mulheres, não se importando se são meninas de 13 ou 14 anos, para serem estupradas por dezenas de homens, nos chamados bordéis militares. Em meio ao impasse, os personagens começam a ser apresentados de mais maneira mais detalhada, e consiste aí o maior erro do roteiro: a tentativa de impor uma complexidade psicológica à John e Yu Mo, como por exemplo, quando a prostituta relata ter sido uma garota de convento até seus 13 anos, quando fora então estuprada e aliciada por seu padrasto, ou quando John revela ter se tornado um coveiro após a morte de sua filha, que, caso viva, teria então a idade das estudantes do convento. Desnecessário e redundante, afinal, a situação caótica da guerra é trágica por si só. Assim como a fracassada tentativa de criar um romance entre os dois personagens. Não convence em momento algum.
O desfecho, confesso, é um dos mais belos e significativos. As prostitutas decidem ir no lugar das garotas. Decisão tomada após a deslumbrante sequência na torre da catedral, da qual as meninas ameaçam se jogar por temerem o estupro. A partir de então, as prostitutas passam a se transformar fisicamente na virgens do convento, em um sequência de imagens instigantes e das mais emocionantes. A transformação acontece, e o momento chega. Os japoneses levam suas presas. John, fingindo ser padre, foge de Nanquim com as garotas. O que realmente aconteceu com as mulheres, não é mostrado. É claro, levando em consideração os fatos históricos, o estupro e a violência seriam inevitáveis. Talvez, justamente por isso, a escolha do diretor é mais singela: a última imagem, mostra, através dos coloridos vitrais da igreja, a chegada das prostitutas sendo admiradas por Shu (Zhang Xinyi), uma das estudantes do convento. Comovente. Comovente e arrebatador.
O filme propõe um trabalho essencialmente visual. Encantador e saboroso aos olhos de qualquer um. Os personagens poderiam acrescentar, em sua individualidade, mais à história, caso tivessem recebido um contorno mais enxuto e oportuno. A violência é mostrada de maneira clara. Os extremos da guerra e do ser humano, também. Mas, o sentimento final, não se relaciona com nenhum deles. O sentimento final é o de comoção. Comoção para com um povo que, sabemos, não existe ou existiu somente nas telas de um cinema. Um povo que foi e continua sendo vítima das bestialidades de qualquer conflito armado. Um povo que, mais do que qualquer outro, está recheado de heróis e heroínas.

Postado por Danilo Craveiro
Discussão 1 Comment

1 Comentário em: Criticando - Flores do Oriente

  1. Anônimo

    Filme fantástico, ótima crítica.

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